terça-feira, 1 de março de 2011

Carta de Referência para um Desconhecido

Na lista Papo Naturista, Renata Freira do NIP, também presente no debate no Congrenat, fez umas colocações que creio que iluminam o assunto do papel do passaporte naturista.

Como já falamos aqui, alguém que não acompanhou um diálogo que se arrasta faz anos tem um certo dificuldade em seguir uma conversa com muitas referências implícitas às outras carnavais.

Mas, também, alguém que participa de um debate, tende a ouvir mais seus próprios argumentos, e sentir que estes tiverem uma aceitação maior do que os de um outro participante, com outras idéias, pensaria.

Venda do passaporte é livre no exterior

Na lista Peladistas Unidos, que é internacional (como o ELAN não foi), chegaram missivas d'além mar. "Latin Nude Naturist" confirmou a visão do sr. Marcelo Pacheco, afirmando que qualquer um pode comprar o passaporte no site do AANR, e que ninguém nos EUA exige este bendito passaporte. A AANR saiu da INF, então a disponibilidade do passaporte INF pelo AANR já pode ser coisa do passado, mas durou um bom tempo sem implicância da INF, então não há porque o Brasil deve ser mais restritivo que os EUA.

Pelo email, sr. Fritz Louderback, com ampla experiência em naturismo internacional, confirma a versão de que o passaporte é livremente vendido e é para levantar dinheiro, e contribuiu umas informações sobre o histórico do documento:
A INF venderá e quer vender cartões INF. Eles nunca foram para ser evidência de uma conexão com naturismo. O homem que originou os cartões é um americano, Hap Hathaway. Eu jantei com ele no seu aniversário ontem. Os cartões era para levantar dinheiro e dava um desconto para aqueles que compraram. Hap nunca pretendia que os cartões seriam usados como uma licença para entrar num área naturista.

Um recado no grupo usenet uk.rec.naturist.uk de 2006 afirma que:
INF "passports" (sic) now have their place firmly in history and only but a few French resorts seem to be clinging to the requirement to have them.

O que senti da reunião, foi que a posição do Pacheco levou o debate. Ainda, se alguém emitiu 300 passaportes para qualquer um que mandasse dinheiro, na prática já foi para o espaço a idéia de que o documento qualifica o portador.

A visão do Pacheco difere da minha visão do Passaporte INF. Porém, as colocações de pessoas que conhecem naturismo em outros partes do mundo, me persuadem que o Pacheco está certo neste ponto, e eu estava errado.

Carta de referência

Vamos passar, então, para a visão do cartão da Renata:

O cartão é uma referência e deve ser aceito como isto. Na realidade não é uma declaração de perfeição, mas é uma referência de bons costumes "assinado" pelo responsável que concedeu o cartão e o recomenda....


O que vem à cabeça de imediata é um texto de Benjamin Franklin, "Modelo de uma Carta de Referência para uma pessoa que você nem conhece":

Paris, 2 April, 1777.
"Sir,
"The bearer of this, who is going to America, presses me to give him a letter of recommendation, though I know nothing of him, not even his name. This may seem extraordinary, but I assure you it is not uncommon here. Sometimes, indeed, one unknown person brings another equally unknown, to recommend him; and sometimes they recommend one another! As to this gentleman, I must refer you to himself for his character and merits, with which he is certainly better acquainted than I can possibly be. I recommend him, however, to those civilities, which every stranger, of whom one knows no harm, has a right to; and I request you will do him all the good offices, and show him all the favor, that, on further acquaintance, you shall find him to deserve."

Vamos repetir parte disso em português:
"Eu o recomendo, para receber aqueles cortesias, devidas a qualquer estranho sobre quem não se conhece nada desabonador; e peço ainda você lhe presta toda a assistência, e trata como todo o favor, que o conhecendo melhor, você julga que ele merece."

Síntese

Pacheco vende para qualquer desconhecido. Renata disse que é somente uma carta de referência. E Franklin (que vale notar costumava tomara um "banho de ar" pelado todos os dias) nos fornece uma carta de referência para um desconhecido.

Chega de exclusão

Uma das coisas que mais achei estranha no naturismo brasileiro, é a obsessão com exclusão. Quem podemos restringir? Como deve ser o procedimento para expulsar pessoas? Quantas barreiras podemos colocar para alguém entrar num grupo, num espaço, até numa praia pública?

Com mais pesquisa no naturismo brasileiro, entendi que várias destas obsessões -- contra solteiros, contra homossexuais, as patrulhas ideológicos (mas chamadas de "eticas") permanentes -- não são características históricas do naturismo brasileiro, mas somente as distorções da era Rossi, que está se encerrando, tardiamente.

Como o naturismo pode crescer se qualquer um que aceita um novato, está colocado na posição de fiador moral? Arnaldo do Mirante, o espaço naturista mais próximo ao maior metrópole do País, nem emite para não ter responsabilidade.

A carta de Franklin é, ainda depois 230 anos, um modelo que podemos seguir, em como tratar um desconhecido. Está mais do que na hora de abandonar as paranóias e a exclusão que foram impostos no naturismo brasileiro no último quarto de um século, de voltar à liberdade, à tolerância e à espírita aberta que caracterizaram o naturismo de Luz del Fuego e seus sucessores.

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