domingo, 14 de agosto de 2011

CRIANÇAS NO NATURISMO

É PERIGOSO EXPOR AS CRIANÇAS À NUDEZ?


(Extraído da revista Nude & Natural)
Esta pergunta cresce distorcida na cabeça dos naturistas quando grupos políticos e religiosos tentam banir o nudismo social e até mesmo classificar arte e fotografias contendo a mera nudez como "pornografia". Muitos "peritos" em educação infantil



estão prontos a culpar uma exposição precoce à nudez, por várias doenças da infância. Será que é este o caso mesmo? Alguma confusão pode ser gerada a partir do desconforto inevitável que muitas pessoas - pais e educadores inclusive - sentem em relação a qualquer coisa que sugira sexualidade infantil. As pesquisas a respeito da sexualidade infantil parecem uma viagem através do deserto: longos trechos de "nada" intercalados por breves visões de atividade com algum interesse.


Alayne Yates (1979) historiou a confusa e esparsa evolução do estudo acadêmico do tópico da sexualidade infantil em geral, e em particular a pobreza de material conciso de referência para pais e educadores.

Nos Estados Unidos, pesquisa desta natureza tem sido historicamente vista como desnecessária (a reação mais leve), intrometida (uma crença comum entre educadores é que a sexualidade infantil é responsabilidade dos pais) ou malévola (especialmente entre pessoas e grupos que acreditam em certas religiões e dogmas). Os impedimentos à pesquisa é um problema, principalmente às famílias e os grupos que não compartilham dos pontos de vista prevalecentes a respeito da sexualidade em geral e do nudismo em particular.

Smith e Sparks (1986) citam inúmeros exemplos de famílias que são nudistas, mas que escondem costumeiramente este aspecto da vida, com medo de que os outros, descobrindo, vão desaprovar. Temem a desaprovação porque não tem base alguma de pesquisa acadêmica que apóie a crença de que o corpo é uma entidade normal e que a nudez não sexual não prejudica as crianças (e na verdade é benéfica).

Felizmente para as famílias nudistas, vários pesquisadores tiveram interesse no assunto da nudez e do desenvolvimento infantil. Infelizmente poucos além desses decidiram repetir essas pesquisas, possivelmente devido a razões resumidas por Yates. Este artigo pretende revisar e avaliar três estudos de pesquisa relevantes:

1. Estudo de Robin Lewis e Lois Janda de 1988, "A relação entre o ajustamento sexual do adulto e as experiências infantis de exposição à nudez, dormir na cama dos pais e o posicionamento dos pais em relação à sexualidade";

2. O estudo de Ron e Juliette Goldman de 1981, "Como as crianças percebem as roupas e a nudez: um estudo transnacional"

3. Estudo de Marilin Story de 1979, "Fatores associados com concepções do próprio corpo mais positivas em crianças pré escolares".

Influências da Infância no Ajustamento do Adulto

Lewis e Janda (1988) examinaram a relação entre o ajustamento sexual do adulto e a exposição infantil à nudez, dormir na cama dos pais e o posicionamento dos pais em relação à sexualidade. Eles chamam a atenção para descobertas conflitantes em estudos anteriores: alguns pesquisadores alertaram para conseqüências desastrosas de crianças vendo nudez enquanto que outros relataram benefícios.

Um assunto freqüente foi quanto à situação em que os pais de "forçavam" a ficar nus diante dos filhos (a fim de ensinar aos filhos as diferenças anatômicas fundamentais). Se esses pais não se sentissem à vontade com a nudez, a experiência seria provavelmente neutra ou negativa. Parece que a questão aqui não é a nudez em si, mas os posicionamentos da família em relação à qual é a atitude aceitável e tranqüila.

Lewis e Janda reuniram 210 estudantes universitários como cobaias para seu estudo. Todos os estudantes completaram um extenso questionário aquilatando três experiências fundamentais na infância (aqui definida como o período que vai desde o nascimento até os onze anos de idade): dormir na cama dos pais; posicionamento e tranqüilidade dos pais em relação à sexualidade; a visão dos pais, irmão e amiguinhos nus. Foi obtida também a graduação da tranqüilidade e ajustamento atual em relação ao sexo, através de um extenso questionário.

O estudo encontrou uma relação diretamente proporcional entre a exposição à nudez durante a infância e a tranqüilidade sexual na idade adulta. Os autores chamam a atenção, entretanto, que algumas pessoas poderiam ver isto como um motivo para evitar a exposição das crianças à nudez, pois a tranqüilidade mencionada foi medida incluindo a aceitação de padrões que seriam consideradas imorais ou indesejáveis (como o sexo pré-marital ou a aceitação da homossexualidade).

Os outros fatores (dormir na cama dos pais e a aceitação e tranqüilidade dos pais em relação à sexualidade), apesar de não serem relevantes no âmbito estreito desta discussão, também demonstram uma relação diretamente proporcional entre a exposição infantil à nudez e o ajustamento e a tranqüilidade sexual na idade adulta.

Estes resultados sugerem que as exposições das crianças a nudez e a dormir na cama dos pais não estão relacionadas a maus ajustamentos. Na verdade, a exposição a esses fatores foi correlacionada a uma auto-estima mais elevada e à tranqüilidade em relação à sexualidade. Além disso, as crianças cujos pais aceitavam a sexualidade tranqüilamente tiveram um grau ainda maior de auto-estima e tranqüilidade.

Estes resultados dão a ideia que relatos esparsos de "dano" causado por estes fatores na infância são a exceção da regra, e que as crenças e tabus sociais comumente aceitos precisam ser reexaminados.

As Percepções das Crianças da Nudez e da Sociedade

Muitos pais relutam em permitir que os filhos brinquem ou durmam nus. Ao explicar para as crianças, muitas vezes não usam motivos morais mas motivos pseudo-práticos (como "podes pegar um resfriado")

Os pais também transferem o desconforto que sentem com a nudez ao dar nomes às partes do corpo, muitas vezes usando termos vagos como "ele" ou "lá embaixo", em vez de pênis, escroto, vulva, clitóris e ânus. Os órgãos genitais e o períneo quase nunca são mencionados.

Ron e Juliette Goldman (1981) entrevistaram 838 crianças dos Estados Unidos, Inglaterra, Austrália e Suécia. As crianças tinham entre 5 e 15 anos de idade. Cada criança foi entrevistada individualmente e perguntada no sentido de provocar respostas dando uma idéia de compreensão da criança em relação ao uso de roupas, à nudez (conforme a sociedade como um todo a vê) e ao pudor.

Os pesquisadores fizeram três perguntas às crianças: "Imaginemos que morássemos todos num lugar bom e quentinho; será que precisaríamos usar roupas?" "Por quê?" (Isto é, quais as razões para responder "precisaríamos" ou "não") e "Algumas pessoas sentem vergonha ou se acham ridículas de (mostrar) certas partes de seu corpo; por quê"?

Houve variações no palavreado, no caso de crianças mais jovens ou mais lentas (conforme escrito no original), mas após algumas entrevistas de teste, as perguntas acima, ao que parece, deram lugar a pouca ambigüidade para as crianças de todas as idades. As respostas foram codificadas e quantificadas para avaliar o nível de raciocínio cognitivo de cada criança para as respostas fornecidas. Não houve referência ao nudismo ou não da família apesar de que isto pudesse ser um fator de influência.

Este estudo descobriu que as crianças de fala inglesa foram as mais renitentes em dizer que as roupas são necessárias, mesmo em clima quente; destas, as crianças dos Estados Unidos foram as mais insistentes de todas. Quem falava inglês também avançou ao nível mais alto de raciocínio moral sobre os motivos para se sentir pouco à vontade quando nu e os motivos para usar ou não usar roupas. Parece que as crianças suecas ganharam sempre mais pontos e foram bem menos insistentes com as roupas embora vivessem num clima mais frio e tivessem mais motivos para achar que deveriam usar roupas. Os Goldman apontam para o fato que a educação sexual é compulsória na Suécia após 8 anos de idade e que as tradições do norte da Europa de sauna e FKK (Freikörperkultur ou "Cultura do Corpo Livre") estão firmemente estabelecidas na Suécia.

Esta diferença cultural não fica tão evidente quando se examina os motivos para usar roupas e porque as pessoas poderiam ficar pouco à vontade quando nuas. O quadro revelado pelas percepções infantis foi um em que a nudez, e especialmente a nudez sexual, tem uma forte matiz de culpa.

Conforme aumenta a idade, as crianças dão-se conta da necessidade de não ser diferente (por trás das noções transmitidas pelos mais velhos). Ficou evidente através das respostas de muitas crianças, que foi transmitido raciocínio de nível inferior através dos ensinamentos de pudor pelos pais.

Os motivos pseudo-práticos mencionados acima são usados: Em vez de revelar a falta de desembaraço dos pais em relação à nudez e à sexualidade, o pai ou mãe trata de usar um motivo concreto, racional. Os resultados mostram, entretanto, que o processo de educação sexual deverá vencer miríades de mitologias e racionalizações adultas que impedem as crianças de entender, aceitar e aproveitar o corpo e os seus órgãos sexuais como naturais e normais.

Conflitos Entre as Percepções Naturistas e Não-Naturistas

A concepção do corpo é um aspecto importante da autoconcepção geral, porque as pessoas funcionam dentro das fronteiras do corpo físico.

As concepções baixas ou negativas do corpo têm sido relacionadas à ansiedade sem razão, capacidade diminuída para entrar em relacionamentos íntimos expressivos e diminuição das capacidades motoras.

As crianças de três a cinco anos conseguem identificar de forma válida a concepção do próprio corpo. Numerosos estudos com crianças mais velhas mostraram diferenças significativas entre as respostas masculinas e femininas a testes de concepção do próprio corpo - mas não bem definida tal diferença entre crianças menores. Além disso, não há estudo prévio que examine o papel do tipo de nudez social familiar no desenvolvimento da concepção do próprio corpo. Este estudo poderá ser a fonte mais útil para as famílias naturistas no momento em que tenham que estabelecer uma relação entre os dois.

Marilyn Story (1979) entrevistou 264 crianças de 3 a 5 anos e seus pais. Estes foram escolhidos e organizados de acordo com a situação da nudez familiar: nudista social, nudista exclusivamente dentro de casa (home-nudist) ou não-nudista. Todos eram americanos com números aproximadamente iguais de todas as regiões geográficas dos Estados Unidos.

Os pais foram entrevistados individualmente, para aquilatar as idades, sexos, pesos e ordem de nascimento das crianças. Cada criança recebeu um teste individual em que o entrevistador apontava para uma parte do corpo de um desenho de uma criança nua do mesmo sexo e raça da criança entrevistada e perguntava: "Você gosta do seu ______?"

Isto era repetido para 16 partes do corpo (embora o estudo não especificasse quais). Enquanto estava vendo o desenho, a criança era perguntada também "que parte de seu corpo você gosta mais? Por quê?" e "Que parte de seu corpo você gosta menos? Por quê?" As respostas a estas perguntas foram categorizadas e receberam valores numéricos.

Para as crianças não-naturistas, as respostas para as perguntas "Que parte de seu corpo você gosta mais?" e "Que parte de seu corpo você gosta menos?" não mostraram relação com raça ou localização geográfica. O Gênero foi significativo, as meninas gostando mais dos cabelos, olhos, nariz e boca e os meninos gostando dos braços e dos órgãos genitais; entretanto, os meninos e as meninas não naturistas quase sempre diziam que os órgãos genitais eram os que menos gostavam.

Para os meninos e meninas naturistas (inclusive os naturistas exclusivamente em casa) as respostas às perguntas acima deram resultados muito diferentes. Tanto meninos quanto meninas quase sempre afirmaram que os órgãos genitais eram as partes que mais gostavam. Os meninos e as meninas naturistas também quase sempre responderam que não havia parte do corpo da qual não gostassem, embora muitas vezes expressassem impaciência com a pele, não pela cor racial ou deformidade, mas devido a queimaduras solares ou pouco bronzeamento.

Story também descobriu que o nudismo foi a variável mais importante na concepção do próprio corpo do que foram o sexo, a raça ou a área geográfica. A relação entre o nudismo e a parte do corpo menos amada foi significativa (aproximadamente uma probabilidade de 1:10.000 de ser apenas um resultado aleatório), conforme foi discutido acima.

Na análise do teste das 16 partes do corpo, os naturistas (meninos) ganharam mais pontos que os não-naturistas e as não-naturistas. E as naturistas (meninas) ganharam mais pontos que os não-naturistas e as não-naturistas. Tirando o tipo de nudismo das variáveis, as diferenças nos escores foram bem menos significativas, com os naturistas tendo mais pontos que as naturistas, e os não-naturistas mais que as não-naturistas. O nudismo familiar teve uma correlação mais alta para elevar a concepção do próprio corpo do que teve o sexo, a raça e a localização geográfica. As crianças naturistas tiveram sempre maior número de pontos do que as crianças não naturistas em concepção do corpo, aceitação do corpo e auto-imagem.

Conclusão: A Nudez é Benéfica para a Família e para a Sociedade

Os resultados das pesquisas apresentadas falam em alto e bom som: a exposição das crianças à nudez não apenas não é prejudicial, mas parece ser benéfica. As crianças que são criadas como naturistas (ou em famílias que vêem a nudez como natural) acabam se tornando adultos à vontade com seus corpos e com a sexualidade.

Entretanto esta relação aparentemente clara, não é nem um pouco clara para a maioria dos pais, sejam naturistas ou não.

Yates (1978) teorizou que a maioria dos pais desconhece estes estudos ou o que eles refletem por dois motivos:

Primeiro: os naturistas ainda são amplamente (e erroneamente) tidos em nossa sociedade como aberrantes sexuais. Os que não são naturistas geralmente não têm qualquer experiência direta e pessoal que negue esses conceitos errôneos; muitos naturistas têm medo de revelar o que são por medo da incompreensão dos amigos e da sociedade.

Segundo: a pesquisa da sexualidade humana forneceu avanços estupendos no conhecimento da sexualidade adulta nos últimos cem anos, e isto foi visto como adequado, pois os adultos são claramente seres sexuais. Já a pesquisa paralela, a respeito das crianças, avançou com muito mais lentidão porque os pesquisadores detestam o tópico.

A pouca pesquisa feita, geralmente não foi repetida. A falta de duplicação levou a uma ausência geral de crédito entre aqueles que se baseiam nas pesquisas para darem as opiniões profissionais - e são estas pessoas que aconselham os pais diretamente.

Assim, nos resta o conselho do Dr. Spok, que nos alerta para os horríveis efeitos da exposição das crianças à nudez, mas que nunca fez pesquisa própria - aparentemente as suas conclusões foram baseadas num único caso isolado, que envolveu seu próprio filho.

A Dra. Joyce Brothers, que alerta os pais das "culpas e frustrações terríveis" que as crianças sofrem quando são expostas à nudez normal, também não fez pesquisa própria, mas aparentemente baseou as suas conclusões num trabalho que realizou com crianças emocionalmente perturbadas (Smith e Sparks, 1986)

Descobrimos através de Smith e Sparks que alguns "peritos" publicados por toda parte não são peritos coisa alguma, mas sim indivíduos que tem opiniões pessoais, por acaso, também são bastante lidos por pais que confiam nas opiniões ali expressadas resultam de pesquisa normal.

Bill Peckenpaugh

Tradução: Sérgio Costa