E o Teatro Oficina segue mais vivo do que nunca. Aos 52 anos de vida, o grupo resiste ao tempo e se mantém capaz de aliar a tradição milenar do teatro com a modernidade e o comentário a respeito do momento atual.
Depois de rodar o Brasil com a turnê Dionisíacas, que reúne quatro peças do repertório do grupo, o Oficina desembarcou em sua sede, em São Paulo, para fechar o ano apresentando na capital paulista o quarteto de espetáculos; e desta vez no novíssimo "Teatro de Extadio", uma área acoplada à sede oficial do Oficina, e que durante anos foi motivo de disputa entre o grupo e Silvio Santos - proprietário do terreno onde se instalou o tal Extadio.
E assim o Oficina apresentou no último fim-de-semana o quarteto teatral composto pelas peças "Taniko, o Rito do Mar", "Estrela Brazyleira a Vagar - Cacilda!!", "As Bacantes" e "O Banquete" - apresentadas na sexta, sábado, domingo e segunda-feira.
O fecho foi "O Banquete", de forma apoteótica durante cinco horas de espetáculo. Estavam ali todas as referências que consagraram o Oficina no mundo pop pós-moderno, a partir da década de 90: a irreverência ao adaptar clássicos, os figurinos greco-romanos, a nudez e o sexo sem culpa, a beleza dos efebos, a selvageria, e a comunicação popular e tropicalista.
José Celso Martinez Corrêa, aos 73 anos, continua marcando presença, no papel de Sócrates, roubando a cena. Marcelo Drummond, que estava a cara de Ozzy Osbourne, destilou seu charme e seu habitual deboche delicioso, mas não ficou só nisso: declamou um poema de Homero com brilho, num dos momentos mais lindos e comoventes da peça.
Destaque também para Mariano Mattos Martins, capaz de trafegar entre o humor ácido e momentos de lirismo, e ainda tem a coragem de encarar cenas que poucos atores topariam - como a famosa cena do cunete, claro. Mariano se transforma no palco em uma espécie de mistura de Ney Matogrosso com Pascoal da Conceição - ator que marcou época no Oficina nos anos 90.
A apresentação de "O Banquete" ainda contou com um grupo de homens na faixa dos 40 anos, que estavam na plateia e deram show à parte ao se despirem - completamente - apenas para assistirem ao espetáculo. Com o calor reinante no local, muita gente viu o grupo nu e apelidou o espaço de "Termas Oficina". Ainda, a entrada em cena de uma Hebe Camargo cover, que se banqueteou nas orgias, arrancando aplausos do público em uma noite onde reinou a tolerância, a diversidade e a liberdade de sexos.
Na tarde de quinta-feira (23), como costuma fazer todo ano, Zé Celso liderou no Oficina um ritual em homenagem a seu irmão, Luiz Antonio Martinez Corrêa, morto no dia 23 de dezembro de 1987, com 107 facadas, num crime homofóbico. Em tempos onde esse tipo de agressão voltou a acontecer, torna-se cada vez mais relevante a atitude de Zé Celso e sua trupe em relação ao acontecido.
E por falar em homofobia, o Oficina aproveitou para comentar, em "O Banquete", o recente caso onde homofóbicos atacaram rapazes munidos de uma lâmpada fluorescente. Em cena do espetáculo, um sujeito estilo pastor de TV invadiu o palco portando uma lâmpada idêntica, e ameaçando atacar "os veados da peça". Ao que Sócrates/Zé Celso retrucou: "Lâmpada é para iluminar, e não para quebrar na cara das pessoas...". Por essas e outras o Oficina continua uma entidade indispensável no Brasil.
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