O título da matéria principal é "Todo mundo pelado: naturistas paulistas brigam entre si pelo direito à nudez pública", e os repórteres Ricardo Senra e Danila Moura entrevistaram aderentes de vários movimentos: Alfredo Nora que organizou as manifestações no Parque do Ibirapuera, Rose Santana do SP-Nat, da Marcha das Vadias, da Pedalada Pelada. Um dos criadores desta última, André Pasqualini, deu a frase emblemática da reportagem:
"Acho uma incoerência enorme alguém que se diz naturista ser contra esse movimento no parque", afirma André, que foi preso na primeira bicicletada nudista.
Sobre a rusga entre os pelados radicais e tradicionais da cidade, André tem o seguinte a dizer: "Sabe qual é o motivo? Briguinha de ego, gente reclamando de quem está a fim de formar uma panelinha naturista".
O suite de matérias mostra uma divisão entre os naturistas novos, que fazem alguma coisa, que levam naturismo para as ruas ou os parques, e um outro grupo, que é retratado como pessoas plantadas defendendo seus castelos isolados, com seus mentes medievais.
O jornal ainda coloca as opiniões de três renomados juristas sobre o naturismo público. Topless nunca dá processo, conforme um. E o uso do nu em protesto, é protegido pela Constituição.
Recomendo a leitura integral das matérias. Só não as coloco aqui para respeitar o copyright. Além da mateira principal há uma sobre aspetos legais; sobre terapia corporal nu; sobre "pelados que viraram notícia", e regras de etiqueta, onde se encontra o que a FBrN incorretamente chama de "Código de Ética".
O que importa?
Alfredo Nora postou no Facebook depois que a matéria saiu,
agradeço à revista da folha ter me dado a capa de hoje. mas lamento que mesmo cheios de boas intenções e com pessoas esclarecidas envolvidas, colocaram em primeiro plano, acima das questões fundamentais, uma novela ridícula e insignificante do que chamaram de "guerra entre naturistas radicais e tradicionais" ...Enquando Alfredo era o principal entrevistado, não era o único. Porque São Paulo lembre a Revolução de 1932 enquanto o resto do Brasil nem dá bola? Porque o Guerra Civil americano é ainda importante para os estados do sul, e águas passadas para os do norte? É que a guerra importa mais para o lado que perde.
E como a matéria mostrou, os "naturistas tradicionais" estão perdendo a guerra. Alfredo os procurou e foi repulsado. Sem dúvida, os repórteres ouviram muito mais do "conflito" do lado das pessoas ligados ao "naturismo organizado", do que ouviram de Alfredo, pois para eles, importa mais. Eles que estão fazendo guerra - e vendo que suas "armas" nem atingem o "inimigo". São irrelevantes e obsoletos.
Discorde de Alfredo de que a agressão dos coligados da FBrN seja uma "novela ridícula e insignificante". Eu já escrevi no Jornal Olho Nu sobre a segunda e a terceira "ManiFestAção" no Parque de Ibirapuera. Eu sabia da fricção com o "naturismo organizado", e foi por isso que fui assistir. Não escrevi disso pois ao meu ver não combinava com a linha editorial do veículo, e também porque parecia que poderia ser um aberração momentânea de uma dirigente que estava sob estresse por outros motivos. E atacar uma pessoa nesta situação, não combina com minha linha.
Acertou na mosca
A Folha acertou em cheio. O naturismo brasileiro vive, de fato, uma guerra. A guerra é pior do que a Folha imagina: comentamos esta semana o papel que a atual diretoria da Federação Brasileira de Naturismo tinha nas acusações falsas de pedofilia que causaram a prisão do então presidente da FBrN, Dr. André Herdy. Sobre a "panelinha", uma breve olhada na estrutura da FBrN mostra que a multiplicação de "diretorias" é limitada somente pelo número de parentes e amigos dos manda-chuvas que querem hospedagem grátis em áreas naturistas. A Colina do Sol é um pesadelo de perseguições de quem esteja fora da panela, e privilégios para quem está dentro.
A psiquiatra Carmita Abdo da USP também compara as manifestações usando o nu, e os outros protestos recentes:
Carmita vê paralelo entre a causa de Alfredo e a onda de protestos que começou com cobrança por menores tarifas de transporte público e se tornou algo muito maior no país. "As novas gerações sempre propõem rupturas, que começam com pequenos grupos e atingem o social."
O mundo gira
Para um estrangeiro, a fascinação de Brasil com o "oficial" é em si fascinante. A obrigatoriedade do trabalhador se afiliar ao sindicato do setor (e pagar um imposto ao particulares), e da empresa pertencer ao "sindicato patronal" e também ser tungada, é coisa bizarra. A noção de que tudo mundo precisa ter um "representante oficial", e ainda pagar por isso, remete à época em que esta regras nasceram, quando fascismo emprestou suas ideias para implantar o Estado Novo e seus arquitetos para projetar as grandes construções de São Paulo.O mundo gira. A crença em representantes "oficias" sumiu, até nos representantes eleitos, como as manifestações desta mês mostram. As vantagens organizacionais de um grupo naturista, foram largamente ultrapassadas pelo Internet e pelas redes sociais. O modelo da ditadura de Vargas, as monopólios estatais e reservas de mercado da ditadura militar, reproduzidos em tamanho "PP" nas "concessões" da Colina do Sol, são coisas do passado.
O mundo gira. O novo chega. O velho cede. Mas cedendo, esperneia.