sexta-feira, 29 de junho de 2012

O jornalismo de qualidade

Já visitamos duas vezes o processo contra Marcelo Pacheco da revista Brasil Naturista e do site www.pelados.com.br por ter colocado na capa da revista um menor, sem a devida permissão dos seus pais.  Já vimos a explicação de que não é preciso permissão dos pais e que naturista nem liga em ser fotografado; e vimos o tamanho do império mediática de Sr. Pacheco: 310 cópias vendidas da revista trimestral, e rendimento mensal média conjunta da revista e portal de R$3.707,05.

Dinheiro é somente uma maneira de avaliar um empreendimento. Comparar a Praia de Abricó ao Mirante do Paraíso em termos de faturamento é descabido. Mas um comparação em número de frequentadores até vai.  A descompasso entre resultado financeiro e qualidade do produto é especialmente acentuada em jornalismo, pois os jornais tipo "espreme, sai sangue" tendem a ser os mais populares.

Onde os advogados de Sr. Pacheco encontraram informações?

O Brasil Naturista e www.pelados.com.br são boas fontes de informações naturistas? Bem, os advogados de Sr. Pacheco anexaram ao processo várias informações naturistas. Para mostrar que Luciano, o pai do menino, morou na Colina do Sol, citaram www.calunia.com.br nas fls 46-47 do processo. Para mostrar que foto de criança pelada não é crime (acho que é isso que estavam tentando comprovar) citaram ensaio deste blog Peladistas que foi re-veiculados no Jornal Olho Nu, nas fls 49-50 do processo.  Nas fls 50-51 é a vez do site Naturistas Cristãos. Há, também, nas fls 51-50 a carta encaminhado para o Ouvidor Nacional de Direitos Humanos com o relatório escrito por Sílvio Levy e por mim.

Vimos, então, que os advogados de Marcelo Pacheco, procurando boas informações sobre naturismo no Brasil, os encontraram não no Brasil Naturista, mas nos concorrentes grátis do seu cliente - e geralmente em matérias da minha autoria.

Onde entra Brasil Naturista? 

Os defensores de Marcelo Pacheco citam suas próprias publicações somente ao dizer que a foto do filho de Luciano é "contextualizada", e fornece um login para que o meritíssimo juiz poderia conferir isso por conta própria. Infelizmente, o login não funciona, o magistrado ficando sem condições de "passear" pelo site, algo que seu cargo de trabalho provavelmente nem permitiria.

O que diz a defesa?

Nosso trabalho jornalistica aqui é de explicar: de comparar documentos, depoimentos, e outras evidências, e assim separar os fatos das "versões". Um bom exemplo disso é que, na onda de falsas acusações de pedofilia pelo qual Brasil passa atualmente, peça-chave é sempre o "laudo psicológico" ou psiquiátrica que "comprova" abuso.

No Caso Colina do Sol, comprovamos que a "psiquiatra" nem psiquiatra era; e quando os filhos de Sirineu foram entrevistados por psiquiatras de verdade, sua conclusão de que poderia ter tido abuso, foi baseado num relato da escola de perda de rendimento escolar: mas há duas escolas no Morro da Pedra, e o relato era de uma, e os periciados estudavam já faz muitos anos, na outra.

Analisamos também os registros públicos dos negócios de Celso Rossi, como na Junta Comercial ou no Registro de Imóveis, e vimos a realidade das suas transações.

Porém, tinha um realidade lá para desvender, que geralmente não era o que Celso dizia que era. A vantagem de registros públicos é que exigem que ele se encaixe no mesmo molde de negócios do restante do mundo.

No caso da defesa de Pacheco, não há o que explicar para meus leitores. Os advogados dizem que fugir de Oficial de Justiça durante 3 anos, serve para escapar de culpa. Advogados me falam, que não é assim. Disse que tinha permissão do "padrinho" da criança para usar sua imagem; o advogado de Luciano juntou a certidão de batismo do pequeno, e o padrinho é outro. Disse que naturista nem liga se foto sua ou do seus filhos seja publicada, e meus leitores naturistas tem mais conhecimento disso do que eu.

Do restante dos argumentos, não entendo o que os advogados estão dizendo, se realmente estão dizendo algo. Parece que o argumento é "Se alguém foi acusado de pedofilia, a Justiça deve fechar suas portas não somente para ele mas para todos seus amigos e conhecidos". Creio que o argumento não procede. O Fórum de Taquara parece que tem uma crença divergente da minha, e por isso mesmo Luciano resolveu reivindicar os direitos do seu filho em outra comarca.


quarta-feira, 27 de junho de 2012

O império da mídia desnudado

Homem Invisível: Somente um muro
separa o base de Pacheco do Sahara.
Mas Oficial de Justiça nunca o veja lá.
A revista Brasil Naturista é a única do gênero impressa do Brasil, e junto com seu portal www.pelados.com.br é a única mídia naturista com fins lucrativos do Brasil. O fim é lucrativo, e temos aqui uma fraqueza para a maneira quantativa de olhar o mundo. Ou trocando em miudos, "Tem fins lucrativos. Quanto lucro ganha?"

O lucro líquido é o que entra, menos os custos. Sr. Marcelo Pacheco, ou pelo menos seus advogados, informou "quanto entra" na ação 015/1.09.0002398-2, na 3ª Vara Civil de Gravatai, pedido de indenização por danos morais impenetrado por Luciano Fedrigo, cujo filho foi colocado na capa da revista, sem permissão do Luciano ou da mãe do garoto.

"Portal Brasil Naturista e edição de revistas Ltda" teve em 2011 receita de R$44.484,60, para uma média mensal de R$3.707,05. Não vou chamar a quantia de pequena, pois é uma média mensal R$3.707,05 mais do que Peladistas Unidas faturou no mesmo exercício.

Quantas revistas são vendidas? Vimos na próxima folha do processo que para o número Junho/Julho/Agosto de 2007, foram impressos 2.000 cópias da revista. Onde foram? Viramos mais uma página, e lá está: 1150 foram dados de uma maneira ou outro; 540 encalharam (ou "estão no estoque da empresa") e somente 310 foram vendidos.

No processo, os advogados de Pacheco alegam que a venda da revista só serve para pagar o custo de impressão e envio, sem falar do custo de produzir a matéria editorial. Deixe de contabilizar a renda de propaganda, que em muitas revista bate ou ultrapassa o que os leitores pagam.

Viagens?

Quem acompanha a revista ou o site www.pelados.com.br, nota as constantes viagens do Sr. Pacheco e seu equipe: "BN na Estrada", "Pelados na Europa", etc. Oficial da Justiça constata mesma coisa: Pacheco nunca pode ser encontrado no seu apartamento. Parece que é mais deserto do que o Sahara ao lado!

Não consigo imaginar como nem um solteiro podeira viajar tanto, no Brasil e no exterior, com uma renda mensal média de R$3.707,05. Muito menos levando um entourage.  Pode ser que Marcelo não custeia as viagens com o que ele ganha com sua caneta, ou como dizemos no inglês, "pen", como na expressão "The pen is mightier than the sword". Ouvi até que o "pen" de Marcelo é somente parte da explicação, talvez uns 3/5 da explicação. Mas lidamos aqui com jornalismo, e não com fofocas.


sexta-feira, 22 de junho de 2012

Cúpula dos Povos


Manifestantes na av. Rio Branco, ontem, durante a Marcha Global da Cúpula dos Povos
Pedro Kirilos/Agência O Globo
Hoje, o maior jornal do Brasil, a Folha de S. Paulo, colocou a foto abaixo na capa do caderno Cotidiano da edição impressa. A foto convide reflexões sobre a liberdade de expressão, o nudez , o protesto e a imagem.

Liberdade de expressão

Um dos maiores perigos que o naturismo enfrenta é a falsa acusação de pedofilia, muitos vezes fotos naturistas sendo apresentados para a imprensa como  "pornografia infantil", ou "a polícia encontrou fotos de crianças nuas" como justificava pela prisão.

Possuir ou tirar fotos naturistas, de pessoas de qualquer idade, não é crime. Seria útil a imprensa dizer isso. Mais útil ainda é quando a imprensa exercita a liberdade de usar a foto do nu, em vez de pontificar sobre o assunto. A Folha  imprime fotos de nudez de vez em quando, até na primeira página.  Já documentamos aqui no blog o uso de imagens de crianças nuas na grande imprensa brasileira. No uso do nu no protesto, "the medium is the message": o direito de usar o nu, e o direito de veicular a imagem, são ambos reforçados pelo uso.

Protesto

Pedro Kirilos/Agência O Globo
Agora, o que estes três estão protestando mesmo? A Folha mandou uma jornalista, Laura Capriglione - a mesma que produziu os primeiros textos sérios na grande imprensa sobre a caça às bruxas de Catanduva -  para Avenida Rio Branco, onde ela encontrou "todo tipo de protesto". Outro foto deste mesmo grupo, visto de costas, coloca o assunto em perspectivo: os recados estão sendo escritos com pincel atômico por um homem que veste uma camiseta Ché Guevara, o santo-coringa de tudo que é protesto da esquerda.


Nudez serve hoje em dia para chamar atenção. Certos eventos, como o World Naked Bike Ride, conseguiram banalizar o nudez público. Aqui, estes três conseguiram emplacar no capa de caderno do maior jornal do país, o fato de que eles estavam protestando. Protestando o que? O público não ficou sabendo, e acho possível que daqui não muitos anos, nem estes três vão lembrar exatamente que recado estavam tentando passar.


Nudez

Estou esperando um texto de naturistas ou nudistas reclamando do uso de nudez por estes jovens, porque "não são naturistas", e "aproveitaram o nudez para outra agenda". Felizmente, estamos aqui no blog Peladistas, onde é desnecessário fingir que a "filosofia" de não usar roupa é mais profunda do que a "filosofia" de usar chapéu.

A ideia de que  ha "naturistas verdadeiras" e outras que não são "verdadeiras" apesar de tirar a roupa é útil no naturismo brasileiro, onde já serviu na Colina do Sol para expulsar pessoas e confiscar aquilo para qual pagaram dinheiro.

Quando eu tinha a idade dos jovens nestes fotos,  tatuagem era bastante marginalizado. Uma jovem que apareceu no colégio com um piercing seria internado para tratamento psiquiátrica. Ambos estas modas se normalizaram. Não é mais necessário divulgar que um tattoo no braço não é sinal de uma ficha na polícia. A moda espalhou, a comunidade pequena cresceu. E se diluiu. Perdeu o espírito do grupo perseguido. Mas a ideia não é mesmo deixar de ser perseguido?

A banalização do nudez, em protestos públicos como este, ou eventos culturais como as peças de teatro do Zé Celso, serve para normalizar naturismo. Claro que fazer de naturismo algo normal, o tira dos seus "donos", ou melhor dito, dos seus exploradores. Sei porque eles não gostam disso. Mas não ligo.

A imagem
   
Vimos que estes jovens não estão nus: cobriram seus rostos. E porque?

Ele usaram seus corpos para chamar atenção para seu recado, seja lá  o que for. Mas escondendo seus rostos, mantém sua intimidade. O que importa se uma foto do seu peito ou pinto enfeita a capa do caderno do jornal, se ninguém sabe que é seu?

Já li vários relatos de naturistas novatos que acham bem mais fácil experimentar o naturismo social, se estejam longes de casa onde há pouco chance de encontrar qualquer conhecido. A camisa na cabeça fornece a mesma proteção contra conhecidos, ainda que confere um ar de rebelião de Febem.
 

O saldo do protesto

Creio que os jovens do foto atingiram seu alvo: foram para Rio de Janeiro, participaram de um grande protesto, aparecerem no jornal, e não duvido que houve música, cerveja e sexo. Seu "recado" não foi passado, mas foi algo que eles não cogitaram cinco anos atrás e não lembrarão em mais cinco.

Mas vão guardar o foto de jornal para mostrar para amigos, colegas, e talvez um dia filhos e netos.

O "causo" que ganho com este protesto foi naturismo, ou pelo menos peladismo. Os leitores do jornal foram expostos ao nu em público, e o céu não caiu. Outros jovens, com outros "causos", vão ver de que com mil palhaços na Avenida Rio Branco, num protesto que lembrava os desfiles da Avenida Marquês de Sapucai, foi esta a imagem escolhida para a capa do caderno. Haverá imitadores.

sábado, 9 de junho de 2012

Nudity on Brazilian television

Earlier this year, the Ministry of Justice issued new rules for what's considered proper on Brazilian television. One surprise - for people in North America, anyways - is that simple nudity, without eroticism, is considered proper for all ages, and can be broadcast at any time of day.

In light of that decision, let's look at at past nudity on Brazilian TV. It's never been absent, as documentaries with Brazilian Indians, who don't wear clothes, have always been acceptable, so much so that the popular children's TV series Castelo Ra-Tim-Bum included two boys enacting Indian legends, dressed in only their skins.

But the best example in not in the programming, but the commercials. Two of the most remembered Brazilian television commercials of all time were the Mila Margarine commercials in which a couple of dozen nudist children highlighted Mila's "natural" qualities. Juvenal Azevedo, one of the creators of the ads, posted a remembrance of the campaign's creation five years ago, which we translate below for our Portuguese-impaired readers.

The Swedish Mila Margarine commercial. Image from Juvenal Azaredo's blog

In 1979 (whoa, it's been 28 years!), I directed the Center's creative nucleus along with my partner, Luis Di Nallo, and went to Sweden to oversee the filming of a commercial for Mila margarine. It's worth a long detour to explain why a Brazilian commercial was made in Sweden.

Initially, the briefing we received from Sanbra was to do a campaign along the lines of that of rival margarine Becel, saying those things about the heart, and so forth and so on, almost to the point of the consumer having to ask for a prescription to consume it.

Then, exchanging ideas with Carlos Edo, director of planning and customer service for the agency and a guy who I unfairly forgot to include in the pantheon of great planners (in the article "When planning and creation were lovers," see here in Portuguese), we concluded that, at that stage of the market (28 years ago, don't forget!) to position Mila almost as a medicine would be to give the product the last rites.

By the way, Mila, which was previously handled by another agency, already had its head in the noose, since its sales were below 80,000 tons, or megatons, or who knows what, and if the new campaign did nor raise sales to a level close to 150 tons or whatever, it would be discontinued by Sanbra.

Well, one day when I went out with Di Nallo for lunch - and I remember the food well, because it was a Wednesday and we went to eat feijoada at a place next door to the French restaurant Freddy - while we were tossing down a caipirinha, in the time-honored way I had an insight, and said, "Man, I've bagged the Mila campaign."

With his air of a Buenos Aires joker, Di Nallo looked at me and asked what I had shot. And then I explained, "You know vegetarians and nudists, those exotic people that nobody takes seriously, but everyone respects their point of view, this thing of healthy living, back to nature?". "Well," I continued, "we'll make the campaign in a nudist colony, where the guys eat only fruits, vegetables, whole-wheat bread and, of course, Mila Margarine, since Mila is part of a healthy life."

The gringo's eyes shone, and the meal finished, we went back to the agency and told the idea to Carlos Edo, who immediately saw the campaign's potential and called in one of his partners, Federico, who was not in the business but had common sense, Otto from Media, Leonardo from Production and Vasco from Customer Service, the unfailing Luiz Gonzaga Vasconcellos, and told them the idea. But, in the retelling, Carlos included a detail that only I, when I created the campaign, had imagined differently, and gave the information that the models were to be kids (I confess that in my mind, the models were almost all adults) which led me to "clam up," as they say.

This change, otherwise, helped us to please all sides, such as Federico Common Sense himself, and all began to applaud the creative solution.

And so it was done. I wrote two scripts, one with children rolling in the snow, to be filmed outside of Brazil, of course, and another with a tropical setting amid the vegetation and climate and Brazil, which was eventually filmed in Guarujá on the São Paulo coast.

[Both films can be seen on Juvenal's son's site The line "A única que veio do milho" means "The only one made from corn", which helps explain why corn on the cob appears so much.]

[Juvenal writes a bit about Sweden, and of the ins and out of the advertising business.]

Closing the subject of Mila, the campaign was in the air, and less than a week later, Sergio Mendes asked the Nucleus to to suspend the campaign.

Mila, which in order not to be discontinued needed to reach the level of 150,000 tons or megatons, I don't know, in less than two weeks in the media reached the mark of 450,000 whatevers, tying Sanbra's production line in knots.

In 1989, and so ten years later, I was in Enio and I had lunch with Maria Ines, product manager for Cica who had recently left Sanbra, and during our conversation at lunch, when she knew I had worked at the Center, she told me that at Sanbra they had considered running the films again, but they had given up due to the difficulty of finding the models (by now no longer children) to obtain authorization. She also said that, in research commissioned by the company, Mila's campaign, despite having been broadcast for no time at all and been off the air for ten years, was still the most remembered in the margarine market. A wonder!

What can we expect of the change in the Ministry of Justice rules, which explicitly allow non-erotic nudity, giving as an example of what's acceptable a documentary of Indians? Certainly, the naturist lifestyle is just as acceptable as that of Indians. But the part of television with the strongest motivation to seize and hold the viewer's attention, is the commercials. This was not the only Mila Margarine commercial to feature nudity, or even nude children. This one came later:

Anything in advertising that works is imitated, and this worked very well indeed. There have been other such commercials. I recall one for leading retail chain C&A for Mothers' Day in 1995, with a bunch of naked children running on the beach.

One that revolved around being set at a nudist beach showed an man selling a new ice-cream bar, and the nudists being ecstatic about how good it was, licking their lips and going "Mmmmm". A nudist mother then covered the eyes of her nudist child, saying the spectacle was "indecent". It's worth noting that although in that case the nudists were of all ages, the protagonists were mother and child.

With the new rules we may see more commercials with nude people, and even with nudists, and perhaps even again nudist children. Certainly there is now a moral hysteria that did not exist thirty years ago, but on the other hand "natural" and "organic" too are far more marketable than they were three decades ago.

The desire to sell stuff has not changed, nor the desire to capture the viewer's attention.

For thirty years the United States has been locking up an ever greater share of the population for ever more minor offenses. That trend is now being slowed not by the realization that it is pointless, cruel and evil, but simply because it is expensive and budgets are tight.

If there is a force that can prevail against unfounded hysteria, it is the thirst for money. The greatest ally of freedom of expression may turn out to be the profit motive, simple greed.

quarta-feira, 6 de junho de 2012

Inquérito Civil Público Federal


Do Diário da União, segunda-feira 05 de setembro de 2011, Seção 1, página 180:

PORTARIA No- 322, DE 13 DE ABRIL DE 2011
Procedimento Administrativo nº
133000004028/2003-71 CONVERSÃO
EM INQUÉRITO CIVIL PÚBLICO
O MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL, pelo Procurador da República signatário, com fundamento no art 129 da Constituição Federal, regulamentado pelos artigos 5º a 8º da Lei Complementar nº 75/93, e na Resolução nº 87 do Conselho Superior do Ministério Público Federal – CSMPF:
CONSIDERANDO que cabe ao Ministério Público instaurar inquérito civil para apurar a ocorrência de fatos que digam respeito ou acarretem danos efetivos ou potenciais a interesses que lhe incumbam defender (art 8º, § 1º, da Lei nº 7347/85 c/c art 1º da Resolução nº 87/2006, do CSMPF);
CONSIDERANDO que incumbe ao Ministério Público a defesa da ordem jurídica, do regime democrático e dos interesses sociais e individuais indisponíveis, nos termos do artigo 127 da Constituição Federal;
CONSIDERANDO que, nos termos do art 129, III da Constituição Federal e do art 6º da Lei Complementar nº 75/93, é função institucional do Ministério Público Federal promover o inquérito civil e a ação civil pública para a proteção dos interesses individuais indisponíveis, difusos e coletivos relativos ao patrimônio público e social e à probidade administrativa, dentre outros, inclusive promovendo a responsabilização respectiva;
CONSIDERANDO os princípios constitucionais da legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência, previstos no art 37 da CF/1988 e os princípios da supremacia do interesse público sobre o privado, da finalidade, razoabilidade e proporcionalidade, implícitos do texto constitucional;
CONSIDERANDO que a atual Constituição, em seu artigo 225, dispõe que: "Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações";
CONSIDERANDO que a Lei nº 6938/81 estabelece, no seu art 2º, que: "A Política Nacional do Meio Ambiente tem por objetivoa preservação, melhoria e recuperação da qualidade ambiental propícia à vida, visando assegurar, no País, condições ao desenvolvimento sócio-econômico, aos interesses da segurança nacional e à proteção da dignidade da vida humana, atendidos os seguintes princípios: I - ação governamental na manutenção do equilíbrio ecológico, considerando o meio ambiente como um patrimônio público aser necessariamente assegurado e protegido, tendo em vista o uso coletivo; ()";
CONSIDERANDO a existência de Procedimento Administrativo nº 133000004028/2003-71 versando sobre implantação de projeto naturista na Praia de Pedras Altas, em Palhoça/SC, bem como o tempo decorrido desde sua autuação no âmbito do Ofício do Meio Ambiente e Patrimônio Cultural da Procuradoria da República em Santa Catarina, determino a
CONVERSÃO deste Procedimento Administrativo em INQUÉRITO CIVIL PÚBLICO tendo por objetivo apurar os fatos acima descritos e outros a eles correlatos
Para tanto, determino:
  1. a abertura, registro e autuação de Inquérito Civil Público,com a seguinte ementa: Meio Ambiente Implantação de projeto naturista Praia de Pedras Altas Palhoça/SC Risco de Privatização da Praia ;
  2. a comunicação e remessa de cópia desta Portaria à 4ªCâmara de Coordenação e Revisão do Ministério Público Federal,solicitando a devida publicação;
  3. após, o retorno dos autos a este Gabinete para novas providências

WALMOR ALVES MOREIRA


 

terça-feira, 5 de junho de 2012

Descascando a Tartaruga

A ordem de reintegração de posse do terreno do "Paraíso da Tartaruga", a sede da AAPP - Associação de Amigos da Praia do Pinho, perto da Praia do Pinho em Balneário Camboriu, SC, gira em torno de uma pergunta de identidade - a AAPP é a mesma entidade que a FBrN (née FBN)?


O TJ-SC determinou que sim, não dá para diferenciar um do outro, se baseando, entre outras evidências, numa fotografia da sede do AAPP:
A fotografia colacionada à fl. 165 não deixa dúvida de que a sede social da Associação situa-se no local, objeto da lide, cuja placa indica, inclusive, que a área é "propriedade particular dos Srs. Comendador Aloísio Araújo, Antonio Araújo", autor/apelante. 

De quem pertence o terreno onde o AAPP está instalado?

Existem mais evidências alem desta fotografia? Existem, sim. Olhando do Livro de Atas da FBrN - disponível no site da mesma, escaneado pelo filho de José Tannus, encontramos nas fls 3:

Ata da Reunião do Conselho Maior
Número Um

Aos dezenove dias do mês de outubro do ano de 1988, reunidos à Rua Oscar Freire, 1364, em São Paulo, Estado de São Paulo, foi realizada a primeira Reunião do Conselho Maior da Federação Brasileira de Naturismo, na qual se decidia: 1) Ratificar os termos do Contrato de Comodato firmado entre o Presidente da FBN, sr. Celso Luís Rossi, e os Srs. Aloísio Camargo de Araújo e Antônio Camargo de Araújo, referentes à área de 22.260 m² no município de Balneário Camboriú, Estado de Santa Catarina; 2) Delegar ao Presidente da FBN poderes para firmar, com terceiros, contratos para a exploração comercial da área supre citada, desde que de acordo com os Estatutos da FBN, as Normas Regimentares do Naturismo Brasileiro e o próprio Contrato de Comodato. A presente Ata foi redigido por mim, Carlos Roberto de Paulo Leão, e segue assinado por quem de direito.

Celso Luis Rossi
Hans Frillmann
Luiz Carlos Prestes
Carlos Roberto de Paulo Leão

Isso confirma sem sombra de dúvida, a existência do contrato de comodato entre os donos do terreno e o FBN, único assunto da primeira reunião da federação. Confirma também a delegação para sr. Rossi, ao mesmo tempo presidente da FBN e da AAPP (que pode ser visto nas fls 1 do mesmo Livro de Atas). Fez contratos usando quais dos chapéus? Realmente, não poderia alegar que, num dos seus cargos, desconheceu os compromissos que assumiu no outro. Um pouco em frente, nas fls 5V, no próprio punho e com o egoismo inconfundível de Celso Rossi, encontramos mais uma confirmação dos Araújo como donos da área:

[...] foi a assinatura, no dia 1º de julho de 1988, de um contrato de Comodato entre a FBN e os Srs. Aloísio Camargo de Araújo e Antônio Camargo de Araújo, de uma área de 22.260m², de propriedade destes, defronte a Praia do Pinho, para construção da sede da FBN.

FBN e AAPP: colados no nascimento?

O contrato existe, dos seus termos o TJ-SC citou somente a obrigação de desocupar no fim do comodato. Outro assunto crítico do julgamento foi a pergunta: o AAPP e o FBN são a mesma entidade? O TJ-SC determinou que sim. Vamos consultar de novo o Livro de Atas, para reviver as emoções da segunda reunião do Conselho Maior, nas fls 3V:

Ata da Reunião do Conselho Maior da Federação Brasileiro de Naturismo. Número Dois.

Aos quatorze dias do mês de abril do ano de um mil novecentos e noventa, na sede social do FBN/AAPP, no Paraíso da Tartaruga [...] encontram-se arquivados no escritório da FBN/AAPP, com o seguinte teor [...] reunião a realizar-se no dia 14 de abril, as 20:30 horas, tendo como local a sede social da FBN/AAPP, para tratar dos seguintes assuntos [...]


Três referência em uma página, ao sede do "FBN/AAPP". Dizer que não foram e não são a mesma entidade, fica difícil depois disso.

Além da evidência do Livro de Atas, Celso Rossi como presidente da Colina do Sol e Naturis, usava durante um bom tempo o CNPJ do FBN. Se adquiriu e exercitou o hábito como presidente da AAPP, a confusão entre as entidade foi não somente em cartório mas também no fisco.

A AAPP herdou a obrigação de devolver a área?

Conforma a Acordão na defesa a AAPP,

A demandada, por sua vez, aduziu, em sua resposta, que 1) o contrato de comodato, ora questionado, não foi firmado por ela e sim pela Federação Brasileira de Naturismo - FBN; 2) não é sucessora da FBN, mantendo apenas relação de filiação; 3) os autores não comprovaram a posse anterior sobre o bem; 4) a área, objeto da presente reintegratória, não foi sequer delimitada; 5) no local, além da Associação, existem vários moradores "Condomínio Morro da Tartaruga, FBN e outros" (fl. 99); 6) as plantas juntadas são "apócrifas, irreais e fantasiosas e também totalmente inéptas aos fins colimados" (fl. 103).

Sobre pontos 3) e 4), nada posso acrescentar aos motivos que levou o TJ-SC a rejeitar-los. Sobre item 6), eu presumo que o AAPP tenha razão: já examinei plantas imobiliárias assinadas por Celso Rossi.

Mas será que o Livro de Atas pode iluminar pontos 1) e 2)? Folheando, encontramos nas fls 6 a 6V, nas palavras e no punho de Celso Rossi:

[...] Na ocasião ficou decidido começaremos com investimentos de ordem de Cz$3.000,00, cabendo a cada um, um terço desta quantia, a ser coberto até dezembro, com o fim de construir 2 banheiros e 10 cabanas no Paraíso da Tartaruga. Tudo resolvido e comprometido, voltei para o Pinho, onde comecei a trabalhar no sentido de agilizar, já para a temporada 88/89, a viabilização do projeto. Investi a parte que me cabia e fui abandonado no restante [...] Determinado a não voltar atrás no meu objetivo principal, resolvi mudar-me, definitivamente, para o local. No dia 9 de dezembro de 1988, juntamente com Paula Fernanda Andreazza, instalei minha barraca no mato onde construiria, a qualquer custo, a sede da FBN. Sem recursos pessoas para abraçar     [6V]

todo o projeto da "Naturis", e sem ter a FBN condições de implantar a infraestrutura no local,f

Mais claro impossível: Celso Rossi, presidente FBN e signatário do Comodato, repassou a exploração econômico da área obtido em comodato dos Araújo para a AAPP, presidente Celso Rossi. As alegações 1) e 2) do AAPP são desmentidos em documento público.

"Existem vários moradores..."

Que nos leva ao ponto 5) que existem vários moradores no local. E estão lá, no base de que direito? No processo da reintegração de posse, o atual presidente da AAPP, sr. Luiz Carlos Hack, foi uma das testemunhas, e "... conhece a associação desde 1991, embora tenha passado a utilizar suas dependências apenas a partir de 1999, quando adquiriu uma casa no local de um ex-sócio".

Sr. Hack "comprou" um chalê; pela matéria no Jornal Olho Nu ano passado, venderem e vendem "patrimônio" no local. Deve seguir a cadeia de quem comprou, até chegar ao quem "vendeu" pela primeira vez, o que detinha somente em comodato de cinco anos. Creio que sei ao quem vai chegar. É prescrito, mas seria bom saber.

Neste sentido, é interessante notar nas fls 5V do Livro de Atas,

[...] Elaborei uma "Proposta para Construção da Sede da FBN", com diversos sugestões e um plano para venda de títulos [...]

Reintegração? Para já!

A perda da área já foi determinado pelo Tribunal de Justiça de Santa Catarina. Consta na matéria do Jornal de Santa Catarina que o advogado do dono "... diz que a reintegração de posse poderia ocorrer a qualquer momento", mas que Luiz Carlos Haack, presidente da AAPP, falou que "não há qualquer possibilidade de se proceder a reintegração enquanto o processo estiver aguardando decisão do STJ".

Quem tem razão? Um advogado amigo fez uma busca que confirmou a minha: não há processo no STJ ligado ao número desta apelação, nem com o nome da AAPP, nem do Luiz Carlos Haack, nem do Antônio Camargo de Araújo, nem sob o OAB dos advogados na apelação para o TJ-SC. Ele me informou ainda que apelar para o STJ não tem efeito suspensivo. Imagine, então, não apelar, mas somente alegar para a imprensa que apelou ...

A realidade é que a reintegração de posse aguarda somente o bel-prazer do Sr. Antônio Camargo de Araújo, e nada mais.

Indenização por benfeitorias?

No caso de uma reintegração de posse, há a possibilidade de indenização por benfeitorias. Mas neste caso, a acordão afirma que foi "... comprovada a perda da posse por esbulho praticado pela requerida ...". Lembrando que não sou advogado, uma busca de "esbulho" e "indenização" retorna pérolas deste tipo:

1. Considera-se possuidor de má fé aquele que pratica esbulho, invadindo imóvel cuja posse pertence a terceiro, que fica impedido de utilizá-lo. O direito à indenização pelas benfeitorias úteis, garantido, inclusive, acompanhado do direito de retenção, somente se aplica ao possuidor de boa fé, segundo a regra do artigo 516 do Código Civil. Em relação ao possuidor de má fé, incide o artigo 517 do mesmo diploma legal, que não inclui indenização pelas benfeitorias úteis.

Me parece que a sentença fala para os associados do Paraíso da Tarturaga, "Vai embora, e não peca mais", sem direito a qualquer ressarcimento. Mas se eu for um deles, eu procuraria um advogado - um advogado meu, não um do AAPP - para me confirmar isso.

Há esperança?

O Tribunal de Justiça de Santa Catarina, com as evidências disponíveis no processo, determinou que o contrato de comodato de cinco anos tinha terminado, e que o imóvel precisava ser devolvido. As palavras do fundador do AAPP e FBN no Livro de Atas desta última, confirmam a sagácia dos desembargadores, de maneira retumbante.

A solução mais óbvio seria comprar a área. Ouvi que isso até foi sugerido vinte anos atrás, mas a pessoa que tinha recolhido dinheiro no empreendimento alegou que tudo foi gastou, e se mudou para Rio Grande do Sul. Vinte anos atrás teria sido barato. Hoje seria caro, e depois desta experiência, duvido que o dono aceitaria pagamento parcelado desta turma. Alguém que conhece os valores da região falou que os R$200 milhões falado no jornal é absurdo, e até os R$6 milhões proposta poucos anos atrás, era alto.

Há alguma chance na apelação? Se o dono da terra citar o Livro de Atas do FBrN, creio que nenhuma. A FBrN escaneou o livro e colocou no Internet. Pode ser retirado. Ainda se alguém tivesse feito download, não seria um documento com valor legal. É sempre arriscado destruir evidências, mas o Livro de Atas é um só, e quem sabe onde está agora? Pode ser que ele se perdeu entre uma diretoria e outro?

A não ser que alguém tinha feito cópia autenticada do livro, que é pouco provável, sem o livro haveria alguma possibilidade de futuro para o Paraíso da Tartaruga, sem alguém quer realmente comprar a terra do dono, como poderia e deveria ter sido feito, vinte anos atrás.

segunda-feira, 4 de junho de 2012

Aos passos de tartaruga, o passado chega

Levantamento da bandeira
no Paraíso da Tartaruga
A Justiça é lerda, mas chega. Aos passos de tartaruga, chega ao "Paraíso de Tartaruga" perto da Praia do Pinho, com reintegração de posse iminente, conforme reportagem abaixo. E na execução da hipoteca do Hotel Ocara na Colina do Sol, o TJ-RS em maio apreciou os embargos em menos de uma semana, a desembargadora determinado, "Rejeito os embargos de declaração, porquanto ausente omissão, contradição ou obscuridade na decisão atacada." Há ainda, parece, Embargos à Execução. Mas chegaremos lá.


O que estes dois casos tem em comum, além de naturismo? Tratando de alguém que vendeu o que não era dele, ou pegou emprestado e não pagou, penhorando o que não ser seu, não surpreende que aparece o nome do suspeito de sempre: Celso Rossi.

BRDES x Hotel Ocara
 
Já falamos em outra ocasiões no blog www.calunia.com.br, da negociata do Hotel Ocara, e do assassinato do maior investidor, Dana Wayne Harbour, dento da sua cabana na Colina do Sol. O hotel conseguiu mais de R$500 mil de "investidores", e ainda R$170 mil emprestados do banco público BRDES, vindo da Orçamento da União. Aparenta uns R$250 mil de construção.

O empréstimo foi garantido com um hipoteca do terreno onde o hotel estaria sendo erguido. Fraude: o terreno dado em garantia foi outro, e a substituição foi feito através de documentos públicos, registrados na Junta Comercial. Porém, o BRDES ainda ache que tem em garantia a coração da Colina do Sol, e há processo tramitando para converter o arresto em penhor - e não está no Fórum de Taquara. Sendo que com juros a dívida já ultrapassa R$300 mil, pode ser que vão pedir o penhor do restante da Colina do Sol, e dos outros propriedades que são, ou foram, de Celso Rossi e Paula Andreazza. 

Um senhor recentemente comprou um terreno de Celso e Paulo ao lado da Colina do Sol, por um preço acima de R$50 mil. Aparentemente não leu o blog, nem procurou saber onde estava o processo de usucapião do terreno.  Acho difícil ele reclamar que comprou em boa fé, com tanta documentação disponível. 

Como notamos acima, o TJ-RS já está rejeitando as apelações de sr. Rossi em rito sumário. Creio que haverá novidades do processo de BRDES em breve. Repito as advertências já dadas: não se deve "investir" na Colina do Sol, nem dar dinheiro para Celso Rossi.

Paraíso de Tartaruga/Associação de Amigos da Praia do Pinho

No caso do "Paraíso de Tartaruga", Celso assinou um contrato de comodato, por cinco anos - e começou vender, o que ele tinha de empréstimo temporário. Até um anos atrás, no Jornal Olho Nu de abril de 2011, o AAPP estava ainda solicitando compradores para os notórios "títulos patrimoniais" e "concessões residenciais" de Celso Rossi:

 Há cerca de cinquenta sócios contribuintes atualmente. Todos os donos dos chalés são sócio-proprietários. A intenção é aumentar o número de associados em todas as categorias: contribuintes, proprietários e patrimoniais.


Ouvi algo semelhante de Pedras Altas, onde foi conseguido uma área emprestada da prefeitura, e do que ouvi, sr. Rossi começou vender o direto de construir em área de proteção permanente. Quem tiver detalhes, favor compartilhar.


Sobre o "Paraiso de Tartaruga", vamos citar o blog do Celso:

Durante a viagem, Paula e eu conversávamos. Contei a ela que tinha conseguido uma linda área ao lado da Praia do Pinho e que já havia iniciado a construção de banheiros e cabanas. Ela me contou que já havia sido proprietária de um restaurante de comida natural em Curitiba.

No dia seguinte, cinco horas da madrugada, apanhei a Paula, com uma mochila e duas sacolas, e pegamos a BR 101 rumo à Praia do Pinho, ao Paraíso da Tartaruga, onde passaríamos a morar. Eu, construindo a sede da FBN, e ela, montando um restaurante.

A versão do desembargador

Isso é claro a versão de Celso, e nos escritos dele, ele é sempre protagonista e herói. As vezes herói mal-entendido e injustiçado, mas sempre herói.

O desembargador Ronaldo Moritz Martins da Silva entendeu de outra maneira. Ele declarou a reintegração de posse de posse de Antônio Camargo de Araújo em 15 de dezembro de 2011 em Apelação Cível n. 2007.038124-8:

Por essas razões, comprovada a perda da posse por esbulho praticado pela requerida, deve ser julgado procedente, data maxima venia, o pleito de reintegração, invertendo-se os ônus sucumbenciais. Concede-se o prazo de 15 dias, para a desocupação voluntária, sob pena de reintegração forçada.
O acordão inteira pode ser encontrado aqui.

Parte das suas razões foi reproduzida pelo TJ-SC nos Embargos de Declaração em Apelação Cível, que aqui reproduzimos. A essência é que a Associação Amigos da Praia do Pinho disse que não é a FBrN; admite que o FBrN na pessoa de Celso Rossi assinou um contrato de comodato, prometendo devolver a área em cinco anos; mas disse que não são a FBrN. Na visão deles, a AAPP assumiu todas as vantagens do comodato, sem nenhuma das obrigações. O desembargador não veja distinção entre a AAPP e a FBrN. E que a área era do Antônio Camargo de Araújo, sim, e tem que ser devolvido. Extraindo dos Embargos:
O julgado elucidou de maneira satisfatória as razões pelas quais relacionou a ora embargante com a Federação Brasileira de Naturismo - FBN.
Extrai-se do corpo do acórdão ora impugnado:
[...] Apesar de o contrato ter sido firmado entre os postulantes e a Federação Brasileira de Naturismo - FBN, observa-se, da análise do Estatuto da Associação Amigos da Praia do Pinho, datado de 10.10.1999, que esta localiza-se, também, no Município de Balneário Camboriú, Estado de Santa Catarina, Morro da Tartaruga, bairro de Taquaras, "com fundação, sede e presença física desde 10 de fevereiro de 1986 [...]" (fl. 107). Consoante atesta a certidão existente na última lauda desse documento, o "Extrato" do Estatuto foi registrado em 16.03.1987 (fl. 116).
A fotografia colacionada à fl. 165 não deixa dúvida de que a sede social da Associação situa-se no local, objeto da lide, cuja placa indica, inclusive, que a área é "propriedade particular dos Srs. Comendador Aloísio Araújo, Antonio Araújo", autor/apelante.
A prova oral colhida neste processo demonstra, também, que a Associação utiliza o imóvel em questão, sendo que lá residem inúmeros associados.
Extrai-se do depoimento de Ivan Fonseca:
[...] que é confrontante do imóvel em discussão; que o imóvel pertence aos autores e que compraram de Antonio Atanasio; que os autores sempre estavam na região e no imóvel em discussão; que a Associação ré queria um imóvel para construir sua sede mas o depoente não permitiu que utilizassem seu imóvel; que os autores cederam em comodato o imóvel em questão à associação ré pelo prazo de cinco anos; que a associação utilizava o local para a sua sede e camping; [...] que sabe que depois do término do prazo de comodato os autores pediram a restituição do imóvel; que havia comentários na praia e as pessoas perguntavam para onde iriam; que a associação não restituiu o imóvel e continua lá; [...] que o imóvel em questão é conhecido como paraíso da tartaruga por causa do formato da pedra; que a AAPP e FBN utilizam o imóvel desde 1989 mais ou menos; [...] (grifou-se) (fl. 215).
Luiz Carlos Hack, um dos participantes da Associação, domiciliado no local, foi ouvido como informante. Colhe-se de suas declarações:
[...] que participa da associação e possui, inclusive, uma casa no local, adquirida de um ex-sócio da requerida [...]; O depoente conhece a associação desde 1991, embora tenha passado a utilizar suas dependências apenas a partir de 1999, quando adquiriu uma casa no local de um ex-sócio, de nome Milton L. Pereira. Acredita que a associação requerida ocupe uma área aproximada de um alqueire, ou aproximadamente, vinte e quatro metros quadrados. O depoente não conheceu Celso Rossi e apenas sabe que ele assinou um contrato de comodato em nome da FBN, cujo documento foi, inclusive, verificado pelo depoente em autos de um outro processo em tramitação nesta Comarca. [...] (fl. 234).
O sócio fundador Elmo Schreiber, também na condição de informante, salientou:
[...] O depoente participa atualmente da Associação Amigos da Praia do Pinho, esclarecendo que conhece perfeitamente a área ocupada desde 1987. [...] Os sócios da AAPP não participaram ou anuíram a nenhum documento de fundação da FBN. [...] Que Celso Rossi foi o primeiro presidente da AAPP e após dois ou três anos fundou a FBN. O depoente tem conhecimento de que o contrato de comodato foi firmado por Celso Rossi, na condição de presidente da FBN [...] (grifou-se) (fl. 236).
Amaro Pereira, por sua vez, afirmou:
O depoente trabalha com construção e nessa condição ajudou a construir algumas das casas pertencentes aos sócios da requerida (17 a 20 casas). O depoente veio a conhecer a associação requerida em 1987, esclarecendo que ela lá já estava exercendo atos de posse e que antes da requerida ocupar aquelas terras quem ali mantinha plantações e um "ranchinho" era Felipe Rocha. [...]. Quando o depoente começou a trabalhar ara a requerida, o seu presidente era Celso Rossi e foi ele quem o contratou. [...] (grifou-se) (fl. 237)
[...]
No entanto, nesses autos, conclui-se pelo material cognitivo que não há como separar a FBN - Federação Brasileira de Naturismo da AAPP - Associação Amigos da Praia do Pinho, ora recorrida, já que tanto uma quanto a outra utilizam (assim como os associados da AAPP), sob a mesma condição de comodato, o imóvel dos autores, os quais postulam a retomada, diante do término da permissão de uso por eles concedida, sem devolução do bem. (fls. 318/320) (original sem grifo)
Não se verifica, assim, qualquer contradição a ser suprida, que justifique o pronunciamento deste Pretório.
Data venia, a ora recorrente almeja rediscutir a matéria vencida, por não concordar com o resultado do julgamento da possessória, o qual lhe foi desfavorável. A pretensão, contudo, mostra-se descabida, até mesmo sob a égide do requestionamento.
Há, é claro, vários apelações. Não sou advogado, mas também não me parece que tratam de pontos esotéricos da lei. Olhei uma, e a AAPP disse que a defesa for cerceada, pois o carro quebrou e perdeu a audiência. A sentença foi que isso deveria ter sido levantado faz alguns anos. Pode ser que há algo de maior substância, mas do que já vi dos outros empreendimentos de Celso Rossi, duvido. E a decisão parece cristalina: pediu emprestado por cinco anos, terminou o prazo, tem que devolver.


30/05/2012 | N° 12584

LITORAL

Área de associação naturista é alvo de disputa

Ação judicial questiona propriedade do Morro da Tartaruga, na Praia do Pinho

BALNEÁRIO CAMBORIÚ - Um processo judicial que pede a reintegração de posse do Morro da Tartaruga, área que faz parte da Praia do Pinho, ameaça uma das mais tradicionais comunidades naturistas do Brasil. A ação foi movida há 11 anos por Antônio Camargo de Araújo, que alega ser o dono das terras. No início do ano, o Tribunal de Justiça (TJSC) concedeu sentença favorável a ele, exigindo que a área seja devolvida pelos naturistas a qualquer momento. O caso foi parar no Superior Tribunal de Justiça (STJ), que deverá decidir quem tem direito sobre o local.

Desde a década de 1980, a área, de cerca de 24 mil metros quadrados, é administrada pela Associação Amigos da Praia do Pinho (AAPP). O Morro da Tartaruga abriga chalés, pertencentes aos sócios, e quartos para alugar a visitantes. O terreno estaria avaliado em R$ 200 milhões.

Diogo Nicolau Pítsica, advogado que representa Araújo na ação, diz que a área teria sido cedida à associação em comodato, uma espécie de empréstimo. Mas a entidade não teria aceitado devolver as terras.

– Diante disto, foi pedida reintegração. Meu cliente não tem intenção de acabar com o naturismo, até porque isto não é competência dele, mas ter a área de volta – afirma.

O advogado diz que a reintegração de posse poderia ocorrer a qualquer momento. Mas Luiz Carlos Haack, presidente da AAPP, não acredita nisso:

– Não há qualquer possibilidade de se proceder a reintegração enquanto o processo estiver aguardando decisão do STJ – diz Haack, que foi quem recorreu ao tribunal superior.

Ele explica que o processo teve decisão favorável à associação em primeira instância, na comarca de Balneário Camboriú. Mas a defesa de Araújo recorreu ao TJ, que fez uma análise diferente da situação. A associação tentou cancelar a decisão, mas o recurso foi negado.

A ação depende agora de um parecer dos ministros do STJ, que não tem data para sair. Embora uma possível devolução da área possa interferir nas atividades da associação, segundo Haack não há risco do processo prejudicar a vocação da Praia do Pinho para o nudismo.

dagmara.spautz@santa.com.br
DAGMARA SPAUTZ