domingo, 13 de fevereiro de 2011

Naturista, nudista ou peladista?

Quando recebi o convite para participar do grupo Nati Brasil foi-me sugerido fazer uma apresentação. O que deveria dizer nesta apresentação? Por que eu estava ali. Ou melhor, o que me levou a integrar com naturistas. Comecei a falar da nudez e quando se fala do nu fala-se em oposição ao vestido. E também se fala do esconder o corpo; de se envergonhar do corpo que tem. Tem que se vencer o medo terrível, que venha a se mostrar aquilo que faz parte do que entendemos a ser as “nossas vergonhas”.

A relação da nudez com orgia, malfeitos sexuais, pecado, sempre me incomodou. Sempre fui criticado ao admirar o nu fora dos seus aspectos estéticos e sensuais. Nós somos o corpo e é o corpo que nos dá vida. A vestimenta é uma resposta às necessidades básicas de cada um de nós para nos proteger das intempéries e não para “esconder as nossas vergonhas”. Que contradição! Nós resultamos das relações entre “duas vergonhas”.

Pequeno ainda eu ia ao sítio de meu avô, onde passava temporadas para ficar nu. Sofria muito com furúnculos e ao me despir vinha-me a sentimento de prazer porque as dores do contato do furúnculo com a roupa desapareciam.

Cresci, fui trabalhar e depois que me formei voltei o foco do meu trabalho atividades de pesquisas fora das áreas urbanas. Aliás, entrei na faculdade num curso com este objetivo. Quando estamos em áreas em que não dispomos da intimidade da nossa casa e das áreas urbanas às quais estamos acostumados, aprendemos que cobrir o corpo não significava “esconder vergonhas”, mas de se proteger, e que tirar as roupas também significava proteger o corpo para exercitar os cuidados que temos por ele.

E foi quando aprendi da necessidade de desnudar o corpo para que ele pudesse respirar.

A relação nudez e sexo se dá num outro momento a partir da empatia entre duas pessoas. O sexo, neste sentido, é a coisa mais bela, pois significa a entrega entre duas pessoas. É um momento sublime da intimidade entre pessoas. Inicie-se esta relação com roupa ou sem roupa.

E foi nesta vida longe das áreas urbanas, em contato com a natureza, que também comecei a viver o ambientalismo. Não no sentido ideológico e militante de onde se deseja alijar o ser humano, mas do ser humano como parte dele.

A nossa tentativa de transformar o meio aos nossos desejos, muitas vezes preparando um futuro perverso para as nossa sobrevivência, perdemos a consciência que somos parte bioma, que nós também somos parte da fauna.

A ingressar no Paulinat e nos papos na lista “Papo Naturista” comecei a verificar que muitas pessoas – muitas delas sem as experiências de vida que tive – pensavam de forma semelhante e que tudo isto se chamava naturismo.

Eu era naturista sem saber...

Quem me conhece e já leu as minhas participações conhece as minhas críticas a esta visão moral para com o corpo. As “verdades morais” são como se fosse verdades, e se tornam “mais verdades” quando associadas a prescrições jurídicas. Uma atitude corpofóbica. Talvez seja uma voz no deserto. Mas que permanecerá enquanto houver garganta para bradar.

Isto sou eu. Ou que penso ser. Triste com o encerramento do Paulinat, mas satisfeito porque o ideal continua. Mas onde houver gente, as discussões, haverá discussões, dissensões, acordos e, no nosso caso, o naturismo continuará.

Conversando com Joaquim Salles, ele me falou o seguinte: “os ‘peladistas’ estão certos: estão nus e isso basta, não precisam de mais argumentos e teses para defender isso”. E lendo um texto de ArianeB (http://peladista.blogspot.com/2008/11/deixei-de-ser-naturista-acho-que-vou.html), ela comenta que a natureza é uma desculpa para se ficar pelado. De fato! Eu não escrevi acima que tirar a roupa, para mim, era um prazer porque retrocedia à minha pré-adolescência? E acrescento a este prazer um sentimento de liberdade talvez porque a roupa é uma exigência social, algo que vem de cima para baixo. Serei, então, como ela, Ariane, um peladista?

Tirar a roupa é o desejo de busca de liberdade. E de prazer. Desejo é o que nos falta; é o que buscamos. Buscamos liberdade e buscamos prazer. O desejo é satisfeito quando tiramos a roupa. Para que, então, usar a natureza como bengala para ficar nu? O meu desejo não é o suficiente?

Quanto à busca da liberdade, esta é incessante e me parece cada vez mais distante. Isto é assunto para mais tarde.

O prazer é um interdito para a bem-aventurança. O céu é para os sofredores. Há um quadro evangélico, o quadro dos “Dois Caminhos”, onde há um caminho largo onde se encontram todos os prazeres da vida e um caminho estreito, de difícil trânsito, com vários pastores pregando. Este é o caminho pelo qual se alcança a bem aventurança e o destino no outro caminho é o fogo eterno.

A nudez é associada à orgia, ao pecado e por isto o nosso prazer é um desejo que deve ser interditado. Ao contrário do que Joaquim me falou, o naturista tem que justificar a sua nudez. O peladista não precisa. E a justificativa é institucionalizada com códigos, interdições, hierarquias de poder, etc.

Por fim: no começo deste texto eu me declarei naturista sem saber, mas agora estou a pensar: seria um peladista sem saber?

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